Destaque

PM executa dois camponeses em operação ilegal no Acampamento 2 Amigos, em Rondônia

  • Date : 4 de novembro de 2021

Por Assessoria de Comunicação

Na última segunda-feira (29/10), agentes da Polícia Militar do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) assassinaram dois camponeses do Acampamento 2 Amigos, em Rondônia, na região de Nova Mutum. Apesar da polícia alegar trocas de tiros, de acordo com a advogada popular e integrante da Associação Brasileira dos Advogados do Povo (Abrapo), Lenir Correia Coelho, os camponeses foram executados sem qualquer confronto ou chance de resistência.

Segundo relatos, o helicóptero da PM sobrevoou a casa onde estavam os camponeses que, ao sair da casa e correr para mata, foram alvejados. No mesmo dia da ação, outros camponeses foram torturados. O clima é de medo e tensão na região.

Em nota, a Liga dos Camponeses Pobre, informa que: “Gedeon José Duque e Rafael Gasparini Tedesco eram militantes da Liga dos Camponeses Pobres e lutavam junto com centenas de famílias camponesas por um pedaço de terra para sobreviver e tiveram seu sangue vertido covardemente por defender essa causa”. 

De acordo com a advogada Lenir Correia, não existe liminar autorizando a reintegração de posse da área ocupada pelo Acampamento 2 Amigos, na região Nova Mutum. A ação em trânsito aguarda ainda julgamento na Justiça Federal devido ao parecer de oposição do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). 

O cerco policial com 400 policiais militares e 47 policiais da Força Nacional continuam dentro da Fazenda NorBrasil e Arco-íris, com a justificativa de estarem fazendo “patrulhamento” na região, abordando as pessoas e ameaçando destruir as construções dos acampamento e outras atrocidades, de acordo com denúncias feitas por camponeses. 

Operação Nova Mutum

A Secretaria de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania (Sesdec), com reforço e apoio da Força Nacional, deflagrou desde o dia 16 de outubro a operação Nova Mutum, com objetivo de cumprir mandados de reintegração de posse em oito fazendas localizadas em Nova Mutum Paraná, distrito de Porto Velho. 

Famílias dos acampamentos Tiago dos Santos. Foto: Movimentos Sociais

Logo no primeiro dia, cerca de 300 pessoas do Acampamento Tiago dos Santos chegaram a ser removidas de suas casas por agentes e levadas para a Escola Municipal Santa Julia, na Vila da Penha, localizada a 220 quilômetros da capital, sem qualquer estrutura. A desocupação da área deste acampamento foi paralisada após decisão proferida pela Ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia, que determinou a suspensão da ordem de despejo, em 21 de outubro. 

Em 22 de outubro, a juíza da 7ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho (RO), confirmou a liminar expedida, mandando comunicado da decisão ao Comando Policial responsável pela execução da operação, para que se cumpra a ordem, nos termos da decisão da Ministra do STF. Além das forças de segurança da Polícia Militar, Civil e da Força Nacional – no total, 400 homens – há denúncia por parte dos camponeses de que homens encapuzados – seguranças privados (guaxebas) de latifundiários – também acompanharam a operação. 

Em nota, a Liga dos Camponeses Pobres, denuncia que ao contrário do que o comandante-geral da PM, coronel Alexandre Almeida, afirmou em coletiva de imprensa, as famílias despejadas não receberam qualquer assistência social. 

“A verdade é que além de manterem as famílias amontoadas em condições insalubres numa escola, sem água nem alimentação, cometeram todas sorte de arbitrariedades, como revistas humilhantes, espancamentos, ameaças, intimidações, enquanto que tropas perseguiam as famílias que se embrenharam na mata, além de destruírem moradias e outras benfeitorias, roubando produção das roças, criações e demais pertences dos camponeses, inclusive um posto de saúde que existia na área com todos os equipamentos que tinham dentro, entre outras arbitrariedades já denunciadas”, diz a nota da LCP

Segundo coletiva de imprensa, a PM concluiu a operação Nova Mutum na terça-feira (30/10), concluindo a reintegração de posse em seis fazendas da região.  

Famílias dos acampamentos Tiago dos Santos. Foto: Movimentos Sociais

O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos enviou um ofício para o Coronel Marcos Rocha, governador do estado de Rondônia, no qual manifesta “preocupação sobre as denúncias recebidas de violações de Direitos Humanos que ocorreram na reintegração de posse em Nova Mutum” e solicita informações sobre as medidas adotadas para a garantia de moradia para as famílias despejadas. De acordo com o Comitê, até o momento não houve nenhuma resposta oficial do Estado. O ofício foi enviado em 20 de outubro, mas até o momento, o governador do estado não enviou qualquer resposta.

Em nota, a LCP, informa que uma missão de solidariedade, reunindo diversas entidades democráticas, de direitos humanos e sindicais, com a participação de procuradores e defensores públicos, deslocou-se até a região junto com moradores, mas foram impedidos de entrar na área, bem como as famílias despejadas foram ilegalmente constrangidas e impedidas de retornar para suas posses. Para ler a nota na íntegra aqui.

Disputa Por Terra

A violência no campo não é ocasional, ocorre em quase todo o território do país, embora mais adensado em alguns estados e na Amazônia. Trata-se de fenômeno relativo à luta de classes, com forte protagonismo das elites que dominam o país desde sempre, explorando sua biodiversidade, suas riquezas minerais, seus recursos hídricos, entre outras

O número de conflitos envolvendo especificamente disputa de terra foi de 1.576, de acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT): é o maior registro verificado desde 1985. Este número é 25% superior ao registrado em 2019 e 57,6% maior que o visto em 2018. As famílias que sofrem com  este tipo de ocorrência somaram 171.625. Os povos indígenas são a maioria dessas famílias (96.931, ou 56% do total).

Ainda sobre os conflitos por terra, a CPT, ao analisar a série histórica dos dados (que vem desde 1985), diz que é possível perceber um aumento considerável deste tipo de conflito nos últimos dois anos. 2020 teve um aumento de 25% no número de registros em relação a 2019 e 2019 já havia tido um aumento de 26% em relação a 2018. O número de conflitos por dia, que era de 2,74 em 2018, passou para 3,45 em 2019 e 4,31 em 2020.  

Outro número recorde registrado nesta edição do relatório mostra que 81.225 famílias tiveram suas terras ou territórios invadidos em 2020 – o maior número deste tipo de violência já registrado pela CPT. 71,8% dessas famílias são indígenas. 

Com Informações do Jornal Resistência