Segundo dados da ONU, a cada oito dias uma pessoa defensora de direitos humanos é assassinada no Brasil
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Para lembrar que não existem direitos sem quem lute por eles, na última quinta-feira (9/12), véspera do Dia Internacional dos Direitos Humanos, é celebrado o Dia Internacional das Pessoas Defensoras de Direitos Humanos.
Além de homenagear as milhares de pessoas que historicamente se dedicaram (e se dedicam) à defesa e garantia da dignidade humana, a data também serve de alerta e reflexão sobre a realidade de violência, impunidade e criminalização enfrentada por boa parte delas, especialmente no atual contexto brasileiro.
Segundo relatório publicado em setembro deste ano pela Global Witness, o Brasil é o quarto país que mais mata defensores e defensoras de direitos humanos no mundo, atrás apenas de Colômbia, México e Filipinas.
De acordo com levantamento do Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos, entre 2015 e 2019, 174 líderes comunitários, ativistas, ambientalistas e defensores de direitos humanos foram mortos no país. O que, na prática, significa que a cada oito dias um ativista é assassinado no Brasil e que o país é responsável por mais de 10% das mortes de defensores em todo o mundo.
Quem são?
Em contraposição a rótulos como “defensores de bandidos”, “esquerdistas” ou “povo do mimimi”, a coordenadora geral da ONG Justiça Global e vice-presidenta da Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), Sandra Carvalho, explica à Pulsar Brasil que as pessoas defensoras de direitos humanos são “todos os indivíduos, grupos, organizações, povos e movimentos sociais que atuam na luta pela eliminação efetiva de quaisquer violações de direitos, violências e em prol das liberdades fundamentais dos povos e indivíduos”.
Com mais de 20 anos de trabalho em organizações de defesa dos DH, Sandra destaca que as defensoras e defensores de direitos humanos “contribuem para melhorar as condições sociais, políticas e econômicas” dos territórios em que atuam e “cumprem um papel essencial para o estabelecimento da democracia e do Estado de Direito”.
Contudo, Sandra chama atenação para o fato de que, justamente por desafiar poderes constituídos e responsáveis por violações de direitos humanos, as defensoras e defensores ficam sujeitos a uma série de riscos, que vão desde ataques virtuais, calúnia, difamação, até processos judiciais de criminalização e violência física.
Inclusive, quando questionada sobre as medidas protetivas às defensoras e defensores, a coordenadora da Justiça Global e uma das fundadoras do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) é categórica:
“Vivemos hoje o pior momento da Política de Proteção às Defensoras e Defensores de Direitos Humanos no Brasil”.
Proteção
Para Luciana Pivato, advogada e coordenadora do Programa Nacional Política e Direitos da ONG Terra de Direitos, o Brasil atravessa “um período de legitimação da violência contra aquelas e aqueles que seguem na defesa da democracia e dos direitos humanos”.
“Os frequentes discursos de autoridades públicas com ataques a movimentos populares terminam por difundir uma noção de autorização para ações violentas. Tudo que acompanhamos sobre a flexibilização das regras para porte de armas e sobre o incentivo ao uso de armas, por exemplo, afeta, direta ou indiretamente, a segurança de defensoras/es de direitos humanos”, analisa.
Também integrante do CBDDH, Pivato destaca à Pulsar que o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH), Comunicadores e Ambientalistas, vinculado atualmente ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), sofre seu pior momento durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
De acordo com a advogada, “o PPDDH enfrenta uma grave crise, com baixa execução orçamentária, falta de participação social e transparência, baixa institucionalização, insegurança política na gestão, demora, ineficácia e inadequação das medidas protetivas, dentre outros problemas estruturantes”.
Ainda sobre este ponto, Luciana lembra que em setembro deste ano o governo federal publicou o Decreto 10815/2021 que altera a composição do Conselho Deliberativo do PPDDH. Conforme estabelece a norma, o Conselho passa então a contar com representações da sociedade civil ligadas ao tema de direitos humanos, no entanto, a participação da sociedade não é paritária. O Governo Federal ocupa seis vagas no conselho, enquanto a sociedade civil tem direito à apenas três.
De acordo com Nota Técnica do CBDDH enviada à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (MPF), à Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal e ao Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH): “O Decreto, para além de ser insuficiente para garantir a necessária participação dos entes interessados, também não define de forma nítida como se dará a escolha das organizações da sociedade civil e quanto ao tempo de mandato”.
Desafios
Diante de tal cenário, tanto Luciana como Sandra concordam que não há “receitas” ou “roteiros” prontos para que o Brasil avance no sentido da proteção e garantia da vida das defensoras e defensores de DH. Mas ambas apontam algumas questões e “caminhos” que devem ser encarados por ativistas, políticos, organizações sociais e pela sociedade brasileira como um todo.
O enfrentamento à criminalização de movimentos populares e o combate à impunidade às falhas nas investigação de violações contra defensoras e defensores seriam os principais pontos ao lado da elaboração e adoção de medidas protetivas que atendam às especificidades regionais, de raça, gênero e classe.
Ainda entre os desafios a serem enfrentados, as ativistas destacam a necessidade de implementação de políticas públicas que tratem dos problemas estruturais que levam defensores e defensoras a lançar-se à luta.
“É imprescindível que o Estado entenda que um plano de proteção deve conter medidas que visem o enfrentamento das causas das ameaças, isto é, o racismo, o machismo, a concentração de terras, o desmatamento, etc. Sem isso, as medidas de proteção podem até ser eficientes, porém nunca serão suficientes, sempre haverá alguma defensora ou defensor de direitos humanos em risco!”, pontua Luciana Pivato.
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Evento
Na tarde de quinta-feira (9), o CBDDH em parceria com o CNDH realizou o encontro “Defensoras e Defensores de Direitos Humanos: desafios e contextos à luz dos cenários de 2021”.
Além de debates sobre a violência, impunidade e criminalização das pessoas defensoras de direitos humanos e sobre a construção de uma política nacional de proteção, o evento contou com o lançamento de um “Curso Online de Proteção Integral para defensoras e defensores”. Para assistir ao debate clique aqui.
Ainda durante o encontro foi lançado o relatório “Começo do fim? O pior momento do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos”, produzido pela Terra de Direitos e Justiça Global.
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Reportagem: Filipe Cabral, com edição Jaqueline Deister | Agência de Notícias Pulsar Brasil