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Perfil Contag: 60 anos de existência e resistência

  • Date : 21 de abril de 2024

A partir de abril, todo mês, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, composto por 48 organizações e movimentos sociais, vai apresentar um breve perfil e a história das entidades membros do CBDDH e faz o Comitê ser uma articulação política plural e rica em luta, trajetória e resistência em prol da proteção de defensoras e defensores do Brasil. 

Para começar, trazemos a história da CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares), uma entidade sindical que coordena um sistema confederativo com 27 Federações e mais de 4.000 Sindicatos de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares.

Fundada no Rio de Janeiro, a Contag acumula 60 anos existência e nasceu a partir do acúmulo das lutas e demandas históricas iniciadas ainda na época da resistência dos povos originários, de quilombos como o de Palmares, de movimentos como Canudos e a Balaiada, das greves dos colonos(as) e assalariados(as) rurais, das Ligas Camponesas, Associações de Lavradores, da Ultab, do Master e de tantas outras lutas.

Nesta entrevista, Aristides Santos, atual presidente da entidade, conta como a entidade surgiu e destaca representação da Contag na luta pela garantia, manutenção e ampliação de direitos para mais de 15 milhões de pessoas no campo, floresta e águas, razão para CONTAG integrar o CBDDH e trabalhar em prol de defensoras e defensores rurais de direitos humanos. Confira!

CBDDH: Quem é a Contag?

Aristides Santos, atual presidente da Contag. Foto: Contag

A CONTAG é a primeira entidade sindical camponesa de caráter nacional reconhecida legalmente pelo Ministério do Trabalho, composta por uma diretoria paritária entre homens e mulheres, que defende a valorização e reconhecimento da agricultura familiar. A CONTAG tem como princípios e diretrizes orientadoras da sua ação e prática sindical, a ética, a democracia, a solidariedade, boas práticas, transparência, combate ao nepotismo, respeito à igualdade e diversidade de gênero, sexualidades, geração, crença, raça e etnias. Possui um Centro de Estudo Sindical Rural (Cesir), Centro de Informação e Documentação (CID) e uma Escola Nacional de Formação Sindical (Enfoc) e diversos programas de formação como o Programa Jovem Saber e os Grupos de Estudos Sindicais (GES). É filiada à União Internacional dos Trabalhadores da Alimentação (Uita), à Confederação de Organizações dos Produtores Familiares Rurais do Mercosul Ampliado (Coprofam), ao Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e ao Conselho de Educação Popular da América Latina e do Caribe (Ceaal). Integra diversos espaços de construção, monitoramento e gestão de políticas com governos e a sociedade em âmbito nacional e internacional. No âmbito internacional, preside atualmente a Coprofam e integra a Reaf Mercosul (Reunião Especializada da Agricultura Familiar do Mercosul), o Fórum Rural Mundial, o Comitê Mundial de Segurança Alimentar (CSA) da ONU, o Comitê Diretor Mundial da Década da Agricultura Familiar, e o Comitê Internacional de Soberania Alimentar. 

CBDDH: Quando surgiu a Contag?

A CONTAG foi fundada em 20 de dezembro de 1963. Era um momento crítico da atividade política do país, pois estávamos em 1963 e as forças conservadoras estavam preparando a ofensiva contra o governo João Goulart. No ano seguinte, o presidente da República João Goulart foi deposto por um golpe militar. A CONTAG sofreu intervenção, e o presidente Lyndolpho Silva e demais diretores foram presos imediatamente, o mesmo acontecendo com outras lideranças sindicais rurais nos estados e municípios. Algumas, inclusive, foram brutalmente torturadas e assassinadas.

CBDDH: Para quê e para quem a Contag existe?

A CONTAG representa e luta pela garantia, manutenção e ampliação de direitos para mais de 15 milhões de pessoas no campo, floresta e águas, distribuídas em 3,9 milhões de estabelecimentos rurais, que geram 10,1 milhões de ocupações rurais, respondem por 23% do valor bruto da produção agropecuária e pela dinamização econômica de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes (IBGE, Censo Agro 2017).

CBDDH: Como é o trabalho da Contag e como ele é estratégico para a defesa dos direitos humanos no Brasil?

A CONTAG atua em rede a partir do Sistema Confederativo e de uma estrutura de apoio regional presente em cada uma das cinco grandes regionais do País, baseada na implementação do seu projeto político – o Projeto Alternativo de Desenvolvimento Rural Sustentável e Solidário (PADRSS). O PADRSS reúne proposições de ações para a organização sindical, de diálogo com a sociedade e o Estado, bem como a defesa de ações e políticas estruturantes voltadas ao desenvolvimento do meio rural brasileiro, visando melhores condições de vida e trabalho para os sujeitos do campo, da floresta e das águas. O PADRSS tem como pilares a luta pela reforma agrária, o fortalecimento e valorização da agricultura familiar e a oferta de políticas sociais, e o reconhecimento de seu papel na produção de alimentos saudáveis e sustentáveis, preservação e conservação ambiental e na geração de renda das famílias agricultoras com resultados para o campo e para o conjunto da economia brasileira. A partir das proposições contidas no seu projeto político, ao longo dos anos, a CONTAG, as Federações e Sindicatos apresentam suas demandas, negociam e garantem diversas conquistas para os trabalhadores rurais agricultores e agricultoras familiares junto ao poder público. Realiza, anualmente, o Grito da Terra Brasil, e a cada quatro anos a Marcha das Margaridas e o Festival Nacional da Juventude Rural.

CBDDH: Por que é importante para Contag participar da articulação política do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos?

A luta pela reforma agrária, pela água e pela demarcação do território gera muita violência contra pessoas e comunidades que, na grande maioria das vezes, ficam vulneráveis por estarem em áreas de difícil acesso e de comunicação. Nesse sentido, a CONTAG tem priorizado a ação articulada para fortalecer a rede de proteção e autoproteção de pessoas e comunidades, pois não há possibilidade de enfrentarmos a violência no campo de forma isolada. A CONTAG ao longo de sua história acompanha de perto a questão da violência no campo sofrida pelos trabalhadores rurais, agricultores e agricultoras familiares, além dos povos das comunidades tradicionais, como por exemplo os ribeirinhos. Nos últimos anos, para fazer o enfrentamento à violência no campo, realizamos diversas ações articuladas com outras organizações, como Audiências Públicas e Missões em parceria com o CNDH, ainda participamos e coordenamos em conjunto com outras organizações e movimentos sociais da Campanha Contra a Violência no Campo, que foi lançada em 02 de agosto de 2022, sendo hoje uma importante ferramenta de visibilidade aos casos de violência em todos os locais do País. No ano de 2022, a CONTAG produziu o vídeo “Terra Limpa”, fruto de uma Missão, no estado de Pernambuco, em parceria com o CNDH, a CPT e outras organizações e movimentos sociais que tratam do tema sobre a Violência no campo. Recentemente, no âmbito do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores(as) e Ambientais (PPDDH), elaborou e publicou a Cartilha CONTAG na proteção de defensores e defensoras de direitos humanos. Ainda o Sistema CONTAG tem atuado junto a outras organizações para que as Comissões de Conflitos Fundiários tenham em suas composições a representação das famílias a serem despejadas, a partir da decisão da ADPF 828 e da Resolução 510 do CNJ. No tema da autoproteção de comunidades e povos ameaçados, a CONTAG se articula com a campanha “A Vida Por Um Fio”, participando de debate. Inclusive, debatendo e sugerindo políticas públicas para enfrentamento à violência contra pessoas, comunidades e povos ameaçados.A CONTAG ainda se articula em várias frentes que trata do tema da Reforma Agrária e acesso à terra, como no Campo Unitário, Campanha Contra a Grilagem de Terras; “Despejo Zero”; Fórum Internacional de Lutas Pela Terra e Recursos Naturais; Fórum do Campo; Núcleo Agrário do PT na Câmara Federal; NAAP – Núcleo de Acompanhamento de Políticas Públicas da Fundação Perseu Abramo e da Comissão Terra do CNDH.

CBDDH: Em 60 anos de Contag, o que você destaca?

Foram décadas de resistência à ditadura e de luta pela redemocratização do Brasil. Também foi um período em que a entidade avançou no debate sobre organização e formação político-sindical, legislação rural, educação, previdência, saúde, reforma agrária e desenvolvimento agrícola, direitos trabalhistas, infraestrutura rural, cobrou o cumprimento do Estatuto do Trabalhador Rural e do Estatuto da Terra e participou da discussão sobre a criação de uma Central Sindical Única, das campanhas pela Anistia Política, Diretas Já e da Assembleia Nacional Constituinte que promulgou a Constituição Federal de 1988.

Conheça algumas conquistas que são resultado do trabalho do movimento sindical:

  • Inclusão do trabalhador e da trabalhadora rural no Regime Geral da Previdência Social;
  • Lei da Agricultura Familiar (Lei nº 11.326/2006);
  • Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) – crédito, assistência técnica e extensão rural, Proagro Mais e Programa de Garantia de Preços para a Agricultura Familiar – PGPAF;
  • Comercialização – Programa de Aquisição de Alimentos – PAA, Programa Nacional de Alimentação Escolar – Pnae, Selo Arte e Selo da Agricultura Familiar;
  • Acesso à terra e Reforma Agrária – assentamento de milhares de famílias, créditos iniciais para famílias assentadas da Reforma Agrária e Programa Nacional de Crédito Fundiário – PNCF;
  • Políticas Sociais – habitação rural, Luz para Todos, Água para Todos, cisternas;
  • Educação – Programa Nacional de Educação do Campo – Pronacampo, Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec Campo e Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – Pronera;
  • Sujeitos do campo, da floresta e das águas – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – Peti, Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural – PNDTR, unidades móveis de combate à violência contra as mulheres e Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural;
  • Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo).