Pela vida de defensoras e defensores dos direitos humanos e o fortalecimento da democracia no Brasil e o avanço de políticas públicas sociais para proteção integral
Brasília – É pela democracia brasileira. É pela vida de defensoras e defensores de direitos humanos. Pelo fortalecimento das políticas públicas de reconstrução do país. É pela população indígena Yanomami, Xavante, Pataxó, Kaingang, Guarani-kaiowá e todas outras centenas de povos indígenas no Brasil que lutam por seus direitos e pela demarcação de terras. É pela população quilombola, ribeirinhos, geraizeiros e todos os povos e comunidades tradicionais que vivem sob diversas ameaças, dentre elas a de milícias no campo. É pelas mulheres e população negra brasileira. É pelas pessoas LGBTQIAP+, faveladas e periféricas. É por todos os mortos da pandemia da Covid-19 e seus familiares. Sobretudo, é por todo o conjunto da população e para resguardar a proteção integral das defensoras e dos defensores de direitos humanos que, nesta sexta-feira, 31 de março, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH), vem a público gritar #DitaduraNuncaMais e exigir um plano de reparação da Verdade, Memória e Justiça para os crimes cometidos contra a nação durante o período do governo Bolsonaro.
De acordo com o relatório Variações da Democracia (V-Dem), ao longo dos últimos sete anos, desde o golpe contra a ex-presidente Dilma Rousseff, a posse de Michel Temer e até as eleições os últimos quatro anos de governo de Jair Bolsonaro, o Brasil se tornou o 4º país no mundo que mais se afastou da democracia em um ranking de 202 países analisados. Segundo o Índice de Democracia (LDI), no qual 0 representa um regime ditatorial completo e 1, a democracia plena, o Brasil hoje registra pontuação de 0,53. Uma queda de 0,26 em relação à medição de 2010, que ficou em 0,79.
Este é o quarto relatório consecutivo no qual o país permanece entre os 10 maiores países autocráticos no mundo. Lançado em março de 2023, o relatório do Instituto Variações da Democracia, ressalta que apesar das eleições de 2022 serem limpas, há uma atmosfera intimidação do governo em exercício e violência eleitoral no Brasil, que caracteriza o declínio do estado democrático no país. A pesquisa aponta como evidência que mesmo após eleição, apoiadores de Bolsonaro, invadiram o Congresso Nacional, exigindo intervenção militar em 8 de janeiro de 2023, com apoio e participação de oficiais militares ativos na tentativa de golpe.
É neste contexto que defensoras e defensores de direitos humanos no país trabalham para a manutenção e fortalecimento da democracia, mesmo diante do risco de morte, situações de ameaças e atentados contra seus territórios e seus corpos, sobrevivendo a episódios de violência política, repressão às liberdades de expressão, estreitamento do espaço político, invasões de suas terras e situações de insegurança alimentar grave e pobreza. É neste cenário que o Comitê Brasileiro DDH, articulação em rede composta por 45 organizações da sociedade civil e movimentos sociais, tanto do cenário do campo quanto da cidade, atua no monitoramento da principal política pública para proteção de defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil: o programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH).
Conforme o CBDDH demonstra na 4ª edição do Dossiê Vidas em Luta, que analisa oito casos acompanhados pela entidade no período de 2019 a 2020, “a boiada passou e destruiu” não apenas as políticas de assistência social e saúde pública no país, vulnerabilizando toda a população e deixando a própria sorte os mais pobres e enfermos durante uma crise sanitária global. Mas também através de legislações e atos normativos como no caso do Decreto 10.252/2020, que burocratizou a criação de assentamentos rurais, expôs populações inteiras de indígenas, quilombolas, ribeirinhas, geraizeiras, entre outras, a conflitos de terras e assassinatos.
Além disso, o último governo também se manifestou pelos cortes orçamentários e a edição de atos normativos para minar a política de titulação de territórios quilombolas, paralisando órgãos públicos que deveriam, por lei, garantir estratégias que projetam e reconheçam territórios tradicionais que, hoje, vivem uma série de violências e violações de direitos. A política armamentista disseminada pelo governo bolsonarista favoreceu não só violências quanto favoreceu a organização de grupos armados e paraestatais, que agem com truculência e uso da força para coagir, intimidar, ameaçar, despejar e assassinar defensoras e defensores em seus territórios.
Para o Comitê Brasileiro DDH, o grito de protesto: “#SemAnistia” que tomou conta do país desde a posse do presidente Lula, além de um clamor público contra a impunidade destes possíveis crimes cometidos no período do governo federal bolsonarista. É necessário acontecer uma responsabilização de todos os agentes violadores de direitos humanos e DDHs, garantindo a reparação das violações, estabelecendo uma linha limite, de onde já estivemos e onde nunca mais podemos aceitar estar. Não apenas sobre o período da ditadura civil-militar do passado – celebrada pelo último governo em datas efemérides como esta sexta-feira, 31 de março, data do início do regime militar há 59 anos. Mas, sobretudo, uma política de memória e análise sobre o presente atual da democracia brasileira.
Como escreveu o jornalista Elio Gaspari, em artigo publicado em junho de 2022: “Foi fácil entrar na ditadura, difícil foi sair”. E ainda é! Foi através dos ecos ainda existentes de uma memória “positiva” do golpe midiático-civil-militar de 1964 em nichos da sociedade brasileira que, forças conservadoras de extrema-direita no tempo presente espraiam velhas ideias fascistas que tem repercussões graves na vida das pessoas, como no caso do crime de genocidico contra o Povo Yanomami, que vem sendo investigado por autoridades, bem como a tentativa de golpe contra eleições democráticas e limpas em 8 de janeiro de 2023.
Em 1992, o manual de um importante jornal brasileiro, mesmo diante do processo de redemocratização do país, ainda recomendava designar o golpe de 1964 como “movimento militar”, e não ditadura. Em 2001, no mesmo manual, “em textos noticiosos”, orientava-se usar a expressão ditadura militar para designar o regime que vigorou no Brasil de 1964 a 1985″. Foi só a partir da versão de 2018 do citado manual que, conforme aponta o jornalista Ricardo Noblat que, o dito e a reparação da verdade, memória e justiça de forma correta finalmente chegou. Assumiu-se enfim de modo claro que “a expressão ditadura militar designa o regime que vigorou no Brasil de 1964 a 1985”.
O Comitê Brasileiro DDH acredita que o mesmo “movimento” dúbio não pode ser permitido novamente em relação aos crimes ocorridos nos últimos quatro anos de governo. É necessário que os desvios sejam reparados, investigados e esclarecidos, as políticas públicas sociais de proteção à vida como o PPDDH sejam reconstruídas, a violência política, o racismo e discurso de ódio combatido.
Por isso, nestes 59 anos do golpe midiático-civil-militar de 1964, exigimos Reparação da Verdade, Memória e Justiça para o período do governo federal de 2019-2022, em prol da vida e proteção integral de defensoras e defensores dos direitos humanos e pelo fortalecimento da democracia e defesa da legitimidade das Eleições 2022, reconhecida internacionalmente.