Organizações da sociedade civil e movimentos sociais que atuam na defesa dos direitos humanos no Brasil, encaminharam, no dia 28 de novembro de 2017, um informe às Relatorias Especiais de Defensores de Direitos Humanos, liberdade expressão, liberdade reunião e à relatoria especial sobre água, todas elas da Organização das Nações Unidas (ONU), em Genebra, manifestando extrema preocupação com os acontecimentos referentes às violações de direitos humanos na cidade de Correntina, na Bahia. O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH), a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Terra de Direitos (TDD), Justiça Global, Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) subscreveram o informe.
A denúncia foi inicialmente apresentada em Genebra, durante o Fórum de Empresas e Direitos Humanos da ONU, na Suíça. O evento foi promovido pela Rede Internacional para os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Rede DESC).
Localizado na região oeste do estado, o município foi palco de uma revolta popular no último dia 02 de novembro. Indignados com a perceptível diminuição da vazão dos rios e veredas nas últimas décadas, além do desaparecimento de nascentes, o desmatamento dos campos gerais e chapadões e o prejuízo às práticas de agricultura familiar e pecuária tradicional promovida por comunidades ribeirinhas, centenas de trabalhadoras/es rurais ocuparam as instalações das Fazendas Igarashi e Curitiba.
O volume de água retirado diretamente do rio Arrojado pela empresa Igarashi equivale a mais de 106 milhões de litros diários, suficientes para abastecer por dia mais de 6,6 mil cisternas domésticas de 16 mil litros na região do Semiárido. Noticiado nacionalmente, o fato mobilizou diversos setores do agronegócio, inclusive a chamada bancada ruralista, que tem interesses diretos na região. Correntina está situada na fronteira agrícola que se expande em maior velocidade no país, conhecida como MATOPIBA, siglas que representam a junção de porções do bioma Cerrado dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.
O próprio governador do estado da Bahia, Rui Costa, chegou a declarar que queria saber “quem patrocina o bando de destruição no oeste”, determinando o reforço do policiamento com forte aparato de repressão militar e civil, situação inédita na região, além da imediata investigação da autoria do fato e das circunstâncias que levaram à realização do ato público.
Segundo consta no informe, há denúncias de arbitrariedades que vêm sendo cometidas pelas autoridades locais durante a condução do Inquérito Policial instaurado. Dentre os abusos, são relatados buscas das pessoas que participaram das manifestações pelas comunidades rurais, de forma ostensiva e sem autorização judicial, com a participação direta da Polícia Militar; realização de depoimentos de testemunhas poucas horas depois de terem sido intimadas, impossibilitando o acompanhamento do ato por um/a defensor/a; constrangimento ilegal de menores para receberem intimações por parentes; abuso de autoridade por parte dos delegados, no que tange à condução dos depoimentos, com o uso de ameaças de prisão, gritos e socos na mesa como via de intimidação das testemunhas; além da utilização de viaturas e helicópteros para intimidar a população local.
O informe conclui com a realização de requerimentos às Relatorias Especiais para que, em síntese, monitorem as violações, enviem comunicados ao Estado brasileiro e, especialmente, ao relator de defensoras e defensores de direitos humanos, para que faça uma visita oficial ao Brasil.
Versão inglês do documento
Leia também: Interferência de empresas no acesso da população à Justiça no Brasil é denunciada em Genebra