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Lançamento do Movimento Escazú Brasil destaca Tratado como instrumento de proteção DDHs

  • Date : 17 de abril de 2023

País ainda não ratificou o Acordo de Escazú, primeiro tratado internacional com mecanismos para garantir a proteção de defensores ambientais

Com objetivo de alavancar  o debate e  sensibilizar o governo, a sociedade e o Congresso Nacional sobre a importância de ratificar o Acordo de Escazú – o primeiro tratado de meio ambiente e de direitos humanos da América Latina e do Caribe – organizações da sociedade civil lançaram em Brasília, no dia 13 de abril, o “Movimento Escazú Brasil”.

Apesar de ter sido aprovado em 2018 e assinado pelo Brasil no mesmo ano, o tratado do Acordo, não foi enviado pelo governo Jair Bolsonaro para apreciação e aprovação pelo Congresso Nacional, etapa necessária para a ratificação. O evento, realizado no auditório do WWF, contou com a participação do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) –composto por 45 entidades – e de representantes de outras organizações e movimentos da sociedade civil, integrantes do governo federal, deputados/as e defensores/as ambientais, em quatro mesas de debates.

“O acordo é o primeiro tratado internacional com mecanismos específicos para garantir a proteção aos defensores ambientais e dos direitos humanos. É importante colocar os defensores e defensoras de Direitos Humanos em um lugar de respeito e admiração pelo seu trabalho na transformação da sociedade e na garantia da democracia. Por isso, o tratado do acordo de Escazú se torna importante para a necessidade de repensar a estrutura do judiciário e a forma como ele responde às demandas dos defensores e da sua proteção”, opinou a advogada popular Alane Luzia da Silva, assessora jurídica da Terra de Direitos, representante do Comitê Brasileiro DDH.

Ela participou da mesa “Desafios para a promoção e proteção de pessoas e organizações defensoras de direitos humanos em assuntos ambientais no Brasil”, que contou também com presença de Ivaneide da Associação Kanindé (Rondônia); Claudelice Santos, do Instituto Zé Claudio e Maria (Pará); da deputada federal Célia Xakriabá, da Frente Parlamentar em Defesa de Povos e Direitos Indígenas; Selma Dealdina, ativista quilombola e vice-presidente do Fundo Casa.

POLÍTICA DE PROTEÇÃO

Para Alane Luzia, a implementação da política pública para proteção das defensoras e defensores dos direitos humanos, precisa não sofrer com descontinuidades e a aplicação de orçamento insuficiente. No ano de 2020, foram executados apenas 10% do orçamento previsto ao Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH).

“O Comitê foi criado em 2004 quando foi construída a política [PPDDH]. Mas, como os desafios são muito grandes e, nesse último período enfrentamos a destruição do PPDDH, é preciso agora a sociedade civil se organize para garantir esta proteção enquanto política pública de Estado. Como sociedade civil, a gente tem que desafiar o governo a construir de fato uma política pública que olhe para: gênero, para a coletividade, comunidade, família, prevenção, saúde emocional dos ddhs”, ressalta.

O Comitê Brasileiro DDH e o conjunto de suas entidades, vem fomentando a incidência política desde a posse do Presidente Lula para reconstrução dos espaços de participação popular, defendendo a centralidade dos territórios como essencial para proteção de defensores no Brasil.

Para o CBDDH, o Brasil precisa solucionar a impunidade de casos de violências, ameaças e mortes de defensores de direitos humanos, pois conforme destacou a repesentante do Comitê, caso contrário, o governo estará passando a mensagem de que os defensores devem temer ao se levantarem contra injustiças, pois serão mortos, uma vez que não há proteção para eles no país.

Neste sentido, o Comitê acredita que a ratificação do Acordo de Escazú pelo Congresso Nacional, poderá auxiliar a sociedade civil a combater o aspecto central da impunidade dos violadores contra os defensores de direitos humanos. “É preciso responsabiliz e pressionar o Judiciário brasileiro a responde essas demandas”, enfatiza Alane Luzia.

TERRITÓRIO E PROTEÇÃO DE DDHS

A necessidade da centralidade da demarcação de territórios indígenas e quilombolas também foram citados como sendo essenciais para o governo federal proteger defensores de direitos humanos. “Nós não queremos mais demarcar território com sangue. Nós queremos demarcar território com a caneta. Durante quatro anos de ausência do Ministério do Meio Ambiente, quem foi ministro foram os povos indígenas e comunidades tradicionais. Foram eles que mantiveram as florestas de pé e o Brasil”, ponderou a deputada federal e indígena Célia Xakriabá.

Ivaneide Cardoso, da Associação Kanindé, também destacou que: “não é possível pensar a defesa de defensores sem pensar em demarcação de território”. Para ela, não basta defender um defensor, é preciso defender toda a família interna do defensor, que sofre junto e também é alvo de ameaças”.

Selma Dealdina, ativista quilombola e representante do Fundo Casa, enfatizou que os corpos dos defensores que estão no território “para encontrar as balas”, sendo “a ameaça ao território o primeiro sinal para a morte”. Ela recordou que Binho do Quilombo, defensor dos direitos da comunidade Pitanga dos Palmares. Ele foi executado em 2017, na frente da filha, quando a levava para a escola, a luz do dia.

“Binho foi assassinado porque foi denunciar o aterro sanitário que a prefeitura de Salvador estava construindo perto de um Quilombo. A filha dele assistiu a execução e teve o direito à psicólogo negado por conta de uma rixa política. Todo mundo sabe de tudo, mas a pessoa não passou nem na porta da delegacia. Esse acordo precisa ser feito e de uma conferência para ver se está sendo aplicado”.

E completa: “Não adianta vir depois com reparação que não vai resolver, é uma questão de titulação. É justiça social, ambiental, cultural e ancestral. A nossa relação é com a terra, ela é uma relação ancestral”.

Claudelice Santos, do Instituto Zé Claudio e Maria, pondera que: “O Brasil inteiro é rasgado de sangue com esses megaprojetos que são disseminados como coisas boas, como a solução dos nossos problemas”. Para ela, a ratificação do Acordo de Escazú pode ser “um dispositivo para obrigar o Estado a fornece informações para evitar a morte”, sendo uma garantia a mais na proteção de ddhs.

Sobre o Movimento Escazú Brasil

Integram o Movimento Escazú Brasil as organizações ARTIGO 19, Engajamundo, Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS), Fundo Casa, Fundação Esquel Brasil, Instituto Centro de Vida (ICV), Plataforma CIPÓ, Transparência Internacional– Brasil, WWF-Brasil e o Instituto Nupef. Em breve, outras organizações parceiras devem se associar formalmente ao movimento.

Ao articular países vizinhos para uma Cúpula da Amazônia e apresentar sua candidatura para sediar a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em 2025, o governo Lula deixou clara sua intenção de retomar a agenda ambiental e se reposicionar no debate internacional. Ratificar o Acordo de Escazú é um passo fundamental para essa reinserção do país no debate.