Com duração de dez dias, a primeira viagem do projeto começa pela África do Sul e Gana, promovendo troca de estratégias entre mulheres defensoras
Os desafios enfrentados por pessoas defensoras de direitos humanos ao redor do mundo tem similaridades. Especialmente, em países do Sul Global que possuem ainda frágeis e recentes democracias. É a partir dessa perspectiva que, no Mês da Consciência Negra, o Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH), lança a 3ª etapa do projeto de intercâmbio entre defensoras e defensores, com a primeira viagem para África do Sul e Gana.
Composto por 48 organizações e entidades, a delegação brasileira do CBDDH é formada por cinco membros: Criola, Conexão G, Cfemea, Movimento dos Atingidos por Barragens e Terra de Direitos. O grupo formado somente por mulheres participará da Convenção das Defensoras dos Direitos Humanos das Mulheres Africanas de 2024, que acontece entre os dias 28 e 30 de novembro.
No processo preparação para a viagem, o Comitê Brasileiro promoveu um seminário de formação online entre as representantes das cinco organizações com as defensoras da African Initiative of Women Human Rights Defenders, entidade anfitriã do projeto no continente africano. A primeira viagem de intercâmbio do projeto começou no dia 21 de novembro, tendo duração de dez dias. O objetivo do intercâmbio é impulsionar a articulação e trocar experiências e estratégias entre organizações que atuam na proteção de DDHs no Sul Global.
No seminário de preparação, a delegação do intercâmbio teve a oportunidade de já iniciar a articulação e solidariedade internacional entre o Brasil e a África, além de trocar experiências e estratégias entre organizações que atuam na proteção de DDHs.
“O primeiro contato com a DDH Africana na formação foi muito interessante. Esperamos fazer um trabalho incrível para representar o CBDDH. Acho que para a gente conhecer um pouco melhor [do contexto] numa perspectiva de autodeterminação foi muito importante. E não por texto da internet ou qualquer coisa do gênero, mas pela boca delas e com a autonomia delas sobre as perspectivas de luta e de violência nos territórios que elas vivem e conhecem. Isso foi essencial para que a gente possa chegar lá de uma forma mais tranquila, melhor preparada”, afirma Danielle Moraes, assistente de coordenação de projetos e incidência política, Criola.
Para ela, a incidência será uma oportunidade “não só para o Comitê, mas para todas as organizações participantes” de articular uma solidariedade internacional que “consiga minimamente mitigar um pouco dos riscos, um pouco dos sofrimentos que a gente vem tendo historicamente”.
Jaqueline Damasceno, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), concorda. Segundo ela, já nesta ação do intercâmbio: “deu para perceber que nós temos muitos desafios em comum. Temos muitas situações parecidas, de ameaças de golpe, de violência contra LGBTs, de violência contra mulheres. Nesse sentido, acho que vai ser muito valioso se conectar e, enfim, trocar mais informações e fazer uma articulação também mais duradoura dos continentes”.
E concluiu: “Eu estou bem contente de já ter feito contato com as Defensores de Direitos Humanos da África, curiosa para conhecer mais como elas se organizam, quais são as estratégias de proteção que elas adotam e ansiosa também para contribuir com as diferenças que nós temos no Brasil. Ansiosa para trocar conhecimentos e nos fortalecer também enquanto mulheres Defensores de Direitos Humanos”.
A impressão das participantes traz a reflexão sobre o cenário de violações no continente africado, explicitado por Constance Mukarati, da African Initiative of Women Human Rights Defenders. Ela expôs no seminário que: “as principais violências fazem parte de um cenário com forte influência de um patriarcado, que inclusive está presente nas próprias organizações do espaço da sociedade civil, que tem uma maior presença de homens, uma vez que as mulheres são muito oprimidas”.
E completou: “Por isso, nós pensamos em como fazer nossas vozes serem ouvidas e pensamos em uma plataforma de mulheres para falar e garantir que nossas vozes amplificadas alterasse o status quo do patriarcado, promovendo os direitos das mulheres e pensando nas questões das mulheres a partir da experiência das mulheres sobre os direitos humanos”.
A defensora africana Simphiwe Sidu, ainda explicou que o espaço para a luta dos direitos humanos e a liberdades de expressão no espaço civil público tem um cenário de restrição na África do Sul devido o histórico do apartheid. “Existe a exclusão dos negros no debate público de problemas quanto ao direito à moradia e a terrra, tendo inclusive questão de mortes de pessoas e impunidade. As pessoas que estão e são vistas como linha de frente sofrem ameaças e assédio por engajar as comunidades na luta”.
Contexto
O projeto de intercâmbio do Comitê faz parte do marco dos 20 anos da articulação, composta por 48 organizações, que desde 2004 acompanha as políticas públicas de proteção para defensoras e defensores de direitos humanos. O projeto de intercâmbio prevê ainda outras duas viagens de delegações brasileiras para os países do Sul Global da América do Sul e Ásia, além de um encontro no Brasil.
O projeto foi iniciado em dezembro de 2023, quando o CBDDH recebeu uma delegação de defensoras e defensores da África e Colômbia em Brasília, para a primeira troca de experiências e planejamento das demais viagens de intercâmbios.
Em maio de 2024, aconteceu a segunda etapa do processo com a realização de um seminário virtual entre DDHs do Sul Global: Brasil, África, América Latina e Ásia. Na ocasião, além das trocas de experiências, as organizações anfitriãs de cada continente, alinharam expectativas e o cronograma das viagens de intercâmbio da delegação para cada etapa do projeto.