São inúmeros os casos de ataques nas redes sociais, intimidações e até ameaças que comunicadores comunitários sofrem por exercerem o seu trabalho de veiculação de conteúdo dentro das favelas do Rio de Janeiro e em diferentes partes do país. De acordo com o relatório anual da organização Artigo 19, intitulado de ‘Violações à liberdade de expressão’, publicado no final de 2020, mostrou que, ao todo, foram registrados 38 casos de graves violações, sendo 27, em 2019, e 11, em 2020. “Desse total, são 32 ameaças de morte, quatro tentativas de assassinato e dois homicídios — crimes graves que atingiram comunicadores e estão ligados ao exercício de sua liberdade de expressão. Segundo dados da publicação, o patamar dos últimos anos se manteve próximo à média histórica de 30 casos por ano, indicando que a prevenção desses crimes não avançou no país”.
Em janeiro deste ano, um comunicador comunitário do Jornal Voz das Comunidades, que há 16 anos é distribuído no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio de Janeiro, teve seu celular quebrado por um policial militar, apenas por ele fazer uma cobertura jornalística da operação policial que ocorria dentro da favela naquele mesmo dia. No Conjunto de Favelas da Maré, também na Zona Norte do Rio, os comunicadores comunitários também sofrem intimidações como estas, integrantes de diferentes mídias comunitárias ao longo dos anos relatam diferentes tipos de ataques que recebem pelas redes ou até presencialmente.
Thais Cavalcante, jornalista comunitária e que atua há anos na favela da Maré, afirmou que: “A comunicação que acontece dentro da favela é mais delicada do que a que temos em outros lugares. Além de jornalistas, somos moradores. O cuidado é redobrado e tudo nos envolve emocionalmente também”, completou. Ao longo dos últimos anos, diante do atual governo Bolsonaro, são variados os relatos de jornalistas da mídia comercial, que denunciam as violações que sofrem por exercerem a profissão.
Fato é que a maioria dos casos contabilizados ou os que ganham grande repercussão, são os de comunicadores que trabalham nas mídias comerciais, afinal, são eles que têm em suas redações advogados e/ou deveriam ter apoio institucional. Ao contrário dos comunicadores de favelas e periferias que não têm qualquer tipo de proteção ou apoio jurídico e trabalhistas. Sem contar, que muitas destas ameaças, assim como relatado por Thais, são cometidas por agentes militares dentro do próprio local de atuação e moradia dos comunicadores, aumentando ainda mais a vulnerabilidade dele/dela e de seus familiares.
Ou seja, mesmo diante de tantos relatos e até de assassinatos à comunicadores/jornalistas pelo país, o próprio Estado não avança nas investigações, não faz qualquer esforço para que a garantia à liberdade de expressão/imprensa no Brasil seja um direito pleno à toda a sociedade. Diante disso, é papel de todos e todas atuarem na defesa e na proteção junto a cada profissional de comunicação, que além de pautarem a defesa e a garantia de direitos, também são defensores dos direitos humanos.
Gizele Martins – Jornalista, Mestre em Educação, Cultura e Comunicação em Periferias Urbanas – Autora do Livro: Militarização e Censura: A luta por liberdade de expressão na Favela da Maré, editora NPC.
Foto de Capa: Luiz Baltar