Ação conta com apoio do Programa Somos Defensores da Colômbia e busca ampliar a incidência política nacional e internacional para proteção de pessoas defensoras no Brasil

Na última segunda-feira (23), teve início a segunda etapa do projeto Intercâmbio Defensores do Sul Global, coordenado pelo Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH), com apoio da Fundação Open Society. O objetivo do projeto é fortalecer estratégias conjuntas de proteção de pessoas defensoras de direitos humanos na África, América do Sul e Ásia.
“O projeto de intercâmbio que o Comitê pensou é uma troca entre organizações do Sul Global da América Latina, África e Ásia, para conseguir construir e fortalecer estratégias de proteção, intercambiar informações, para que possamos coletivamente construir uma narrativa sobre defensores de direitos humanos do Sul global para o Sul global”, explica Alane Luzia da Silva, assessora jurídica popular da Terra de Direitos.
Desta vez, o intercâmbio acontece na Colômbia, em parceria com o Programa Somos Defensores. A iniciativa aposta no compartilhamento de experiências e na atuação articulada em âmbitos nacionais e internacionais como caminhos para enfrentar desafios comuns.
“Aqui na Colômbia, nosso parceiro é uma organização especialista em dados sobre violência contra defensores de direitos humanos. Buscamos entender as estratégias desenvolvidas para a proteção de territórios aqui, quais as discussões em curso sobre a política de proteção, e a experiência de um país que ratificou o Acordo do Escazú no ano passado, no contexto da COP da Biodiversidade, em aconteceu em Cali”, ressalta Alane Luzia da Silva, que representa o CBDDH junto com outros defensores de direitos humanos no intercâmbio.
Ao longo de sete dias, entre 23 e 28 de junho, a delegação formada por cinco representantes das organizações-membro do Comitê: Terra de Direitos, ABGLT, Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR), Grupo de Mulheres Brasileiras (GMB) e Coletivo Feminino Plural, cumprirá uma programação extensa com análise de contexto de luta e proteção de defensores (as) na Colômbia.
A etapa da experiência de intercâmbio no país é estratégica para que o CBDDH possa conhecer as múltiplas realidades e dialogar sobre os desafios enfrentados por defensores (as) que, com frequência são parecidos, mesmo que haja fatores que diferenciam os territórios entre os dois países.
Durante o intercâmbio, a comitiva brasileira conhecerá a pedagogia, as linhas estratégicas e protocolos de atuação do Programa Somos Defensores, a plataforma de direitos humanos da Coordenação Colômbia, Europa, Estados Unidos (CCEEU), além de outras atividades estratégicas e culturais.
Internacionalização da luta
Domingas Caldas, do Grupo de Mulheres Brasileiras, acredita que a troca de experiências com um país da América Latina traz para as organizações a chance “de conhecer e aprender”, mas também “olhar e ter vivências com saberes para nos manter de pé na luta e proteção das nossas florestas, águas e na defesa das pessoas defensoras de direitos humanos”.
O GBM é uma organização do Pará com histórica participação no movimento de mulheres e de direitos humanos dentro do estado, que sediará a COP30. Por isso, Domingas destaca que o intercâmbio é “uma oportunidade de promover a articulação entre defensores da Colômbia visando a participação nas atividades da Cúpula dos Povos rumo à COP30”.

Para Cris Bruel, psicóloga e representante do Coletivo Feminino Plural, os intercambistas da comitiva podem adquirir conhecimento sobre ferramentas que permitam a todos enfrentar os desafios no território e atuar com mais preparo, sensibilidade e estratégia.
“Quero compreender melhor os mecanismos de proteção existentes, mas também desenvolver a coragem e a nitidez necessárias para propor novas formas de resistência e cuidado coletivo. Espero que esta jornada me conecte a outras vozes que, assim como a minha, acreditam na transformação social como um caminho de esperança. Que possamos trocar saberes, construir alianças e, sobretudo, reafirmar o poder de quem atua na base, muitas vezes em silêncio, mas com imensa força”, pondera Cris.
Já Patrick Melo, comunicador da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial (IDMJR), enfatiza que tem a expectativa de que, o intercâmbio protagonizado pelo Comitê, possa ser a construção de um espaço para: “que a gente [ddhs] consiga compreender, na verdade, que as nossas lutas por direitos humanos, por dignidade, pela vida, é uma luta que precisa ser internacionalizada.”.
Para ele, o panorama da Colômbia guarda particularidades, mas também une muitos processos capazes de revelar como “os algozes, as armas, as grandes indústrias, as grandes empresas que ameaçam a vida, a dignidade e o trabalho de defensores e defensoras de direitos humanos no Brasil são os mesmos aqui na Colômbia, e são os mesmos no mundo”.
Essa é a segunda viagem do projeto de intercâmbio, apoiado pela Fundação Open Society, que é um dos marcos da atuação dos 20 anos do CBDDH. A primeira viagem ocorreu em novembro de 2024 para Gana, durante a Convenção das Defensoras dos Direitos Humanos das Mulheres Africanas.
O projeto de intercâmbio Sul global prevê mais uma viagem para as Filipinas, além de um encontro no Brasil. Todos os intercambistas são integrantes de organizações-membros da articulação política do CBDDH, composta por 48 entidades do Brasil.
“A importância desse intercâmbio que estamos fazendo com a Colômbia e com os países da África do Sul e com Filipinas é conseguir estabelecer uma rede efetiva de contato e de troca de experiência sobre a política de proteção na defesa dos defensores de direitos humanos entre todos nós, porque ao partilhando essas experiências, conseguimos compreender os desafios”, frisa Eduardo Guimarães.
Diretor-secretário de direitos humanos da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos, ele afirma que como representante da ABGLT no CBDDH, o intercâmbio traz a oportunidade de aprofundar a presença transversal da temática da igualdade de gênero e da diversidade sexual e olhar para como “ela está sendo tratada, como ela está sendo vista, e o quanto ela não pode ser esquecida” na proteção integral de defensores de direitos humanos.
E completa: “A população LGBTQIAPN+ é defensora de direitos humanos e, portanto, lutar pelos nossos direitos é lutar pelos direitos humanos”.
Contexto do projeto
O Intercâmbio CBDDH Defensores Sul Global nasceu a partir da análise do Comitê sobre como a violência imposta por centenas de anos de colonialismo, se manifesta no Sul Global em processos de subalternização política, social, econômica e cultural frente a países do norte global. E, quem se insurge contra essa realidade para defender os direitos humanos, a partir de múltiplas perspectivas, muitas das vezes se encontra em situação de risco e vulnerabilidade.
Vários países do Sul Global compartilham processos históricos e políticos que os aproximam, apesar das inúmeras peculiaridades históricas. Nessa porção do globo as democracias são experiências mais recentes e ainda em consolidação, sobretudo no tocante a agenda de direitos humanos. Nos últimos anos, a América Latina, por exemplo, experimentou o retorno de governos totalitários, que agora começam a dar lugar a importantes vitórias democráticas eleitorais, que ainda muito frágeis, são espaços de incidência para a sociedade civil.
Além disso, diversas organizações do Sul Global possuem décadas de expertise na defesa de defensoras e defensores de direitos humanos e na luta por sociedades mais justas, igualitárias e inclusivas. Por isso, a articulação do intercâmbio tem como foco garantir o protagonismo das organizações anfitriãs no desenho da agenda de intercâmbio e no caráter das atividades que serão priorizadas.
O Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores (CBDDH), desde 2004, acompanha e produz incidência na política de proteção ddhs no país, além de atuar, de diversas formas, para garantir a proteção em situações de risco, ameaça, ataque e/ou criminalização em decorrência de sua atuação.