Debater os conflitos agrários e a situação de pessoas ameaçadas de morte na região de Anapu, município paraense com altos índices de conflitos agrários e mortes, foram as propostas da audiência pública realizada na última sexta-feira (09), pela Comissão de Direito Agrário da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Pará. A audiência, realizada em Belém, teve como tema “Conflitos e Mortes de Trabalhadores Rurais em Anapu e região”, e ocorreu na sede seccional da OAB Pará.
A possibilidade de identificar a natureza desses conflitos e os projetos em disputa na região foram os pontos importantes do debate, na avaliação do presidente da Comissão agrária da OAB (PA), Ibraim Rocha “É fundamental que a sociedade civil reafirme, junto com a OAB, a importância, para todo o estado, da manutenção de um projeto de reforma agrária diferenciado que sirva ao interesse da comunidade. Além de uma intervenção do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e da Reforma Agrária) no sentido de apoiar a natureza jurídica desse modelo, onde qualquer intervenção, seja da policia civil, militar ou dos órgãos ambientais e fundiários, se dê nessa perspectiva”, enfatiza Ibraim Rocha.
O advogado sugere que o modelo ideal seria Projetos de Desenvolvimento Sustentável (PDS), como o idealizado pela missionária Dorothy Stang, assassinada em 2005, na região de Anapu. Assim como a missionária, diversas lideranças foram assassinadas por conta de conflitos agrários, e outras continuam ameaçadas. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), entre 2015 e 2018, 15 trabalhadores rurais foram assassinados na região.
Alguns dos encaminhamentos retirados da audiência foram a realização de uma ação conjunta entre INCRA e ITERPA, desenvolvendo ações que promovam a reforma agrária, com foco na preservação ambiental e impedindo invasões aos PDS da região.
Andreia Barreto, defensora pública agrária do estado do Pará, destaca que a defensoria fez um requerimento à Comissão agrária da OAB, relatando uma série de conflitos que ocorrem na região, e aponta o município de Anapu como um dos mais violentos. Ela destaca que, os conflitos agrários se agravaram nos últimos dois anos, e que em Anapu existe uma lista de pessoas marcadas para morrer. A defensora lembra, também, o desmantelamento do INCRA, como um dos fatores que contribuem para o aumento dessa violência.
“Hoje, o INCRA tem um problema estrutural que envolve questões como a ausência da ouvidoria agrária local e a retirada da procuradoria especializada do Incra. Então, existem outros fatores que estão relacionados nesse contexto, e não se pensa na questão fundiária. Agora, estamos lidando com questões emergências. Como vamos garantir a vida das pessoas e trabalhar com a questão fundiária como pano de fundo principal? Sem a retomada das terras públicas griladas e sua destinação para reforma agrária, vamos continuar “apagando incêndios” de pessoas que estão morrendo em suas terras”, destaca a defensora.
Roberto Porro, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que há quatro anos acompanha as atividades no PDS Virola Jatobá, idealizado por Doroty Stang, aponta que além da ausência do poder público, na solução desses problemas fundiários, outro fator que contribui com a violência é a impunidade.
“Destaco o problema sério de impunidade e omissão do Estado, que favorece o agravamento dos conflitos e a violência. Isso fica patente por alguns aspectos, um deles é a falta de ação do Incra no controle da negociação de terras. É preciso pensar na questão fundiária da região”, aponta o pesquisador.